quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Bodas de Prata

 Vinte e quatro anos, alguns vários miligramas de tarja preta, analgésicos, dietas infernais, viagens e vinte e quatro anos...
  Vinte e quatro anos...Se eu soubesse que o idealismo vermelho dele não resistiria nem três anos, talvez eu tivesse ido em frente no meu projeto de aprender a beber e trocar de curso na universidade. Se eu soubesse que nossa utopia conjunta de amor se resumiria às frias jóias que ele me dava, talvez eu tivesse exercido o direito de ser jovem...mas não .
Eu tinha vinte e quatro anos, uma família socialite para agradar, um noivo cabeludo (que andava com a mesma camisa com estampa de estrela no peito por três dias seguidos), uma faculdade de psicologia numa universidade conceituada para concluir e poucos sonhos. Eu apenas queria um marido no qual eu pudesse dar o nó na gravata, criar crianças e dizer, todos os dias, aos meus pacientes no consultório : -" Como se sente sobre isso ?"
 Eu nunca dei ouvidos aos meus instintos de jovem dos 'anos 80', fui taxada de ' careta ' por todos, mas eu estive muito ocupada com as  provas de vestido, lista de convidados, decoração da igreja e à esperança lúdica de um dia dar uma festa de Bodas de Prata...vinte e cinco anos completos de um casamento seria a glória . Enfim, estive ocupada com todos os preparativos e desejos para o  que seria a grande loucura da minha vida : casar com um garoto menos rico que eu, que usava barba e era rotulado como a ovelha negra, ou melhor, a ovelha vermelha de sua família .
  A grande verdade é que a ovelha negra tornou-se um requisitadíssimo publicitário. Logo, as flores, os beijos e os versos tornaram-se casa de campo, casa de praia, jóias e finais-de-semana vazios em Seviilha.
  Todos diziam : Stella ? É uma mulher realizada com um marido que lhe enche de mimos. Realmente, pode até ser que eu seja...mas, vivo à base de calmantes para aturar os amigos chatos do meu marido, todos eles sempre cheirando a whisk, para estar sempre impecável nos coquetéis, para responder com inteligência e bom-humor milhares de perguntas inoportunas e ter a calma de ouvir meus pacientes e depois sempre dar-lhes ao mesmo diagnóstico :  " A culpa é de sua mãe . "
  Eu gostaria de dizer àquelas mães que, quanto aos filhos, é melhor ter jóias...a desculpa que dou a mim mesma por não poder tê-los .
  Enfim, vinte e quatro anos de um casamento, vinte e quatro anos em vão ! 
  É isso, eu sou Stella Madeira, não mais a Senhora Castro. Psicóloga, sem filhos, recém-saída de um casamento que durou vinte e quatro anos inférteis. Tanta maquiagem, perfume, literatura alemã...tudo em vão . Não terei crianças para educar e nem ao menos amigos de marido para impressionar .
  Sou uma mulher que não foi mulher, que não teve filhos, que viu o amor acabar sem ao menos dar uma festa de Bodas de Prata. Stella Madeira não fez Bodas de Prata.
  Infeliz Stella .
 

2 comentários:

  1. Que tenso! Tava tão feliz no início, rs. Mas de qlqr maneira, hj em dia é raro um casamento durar 24 anos.
    Adorei o texto. Bjoss

    ResponderExcluir