terça-feira, 17 de maio de 2011

Minha primavera

                                                       
 Te olhar asim pensando, tranquila...é algo que não me canso de fazer. Não me canso de ensaiar o que dizer quando você acordar.
 Te guardar, te levar assim, sorrindo linda...é algo que procuro e imploro pra Deus não desmontar. Te quero assim, branquinha, complicada e leve como só você pode ser .
 Te descrever aos amigos, contar tuas falas, tuas faltas compensadas, tuas asas...Cantar por causa da tua pele, sonhar com teus cabelos voando em espirais nas praças, nas ciclovias, nas orlas, na Lapa.
 Te procurar nas cores das festas, nas corridas das crianças, na veia do samba, nas conchas da praia.
 Te beber feito água doce, feito gosto de fruta na batida, feito gota de chuva, feito café quente em tarde cinza.
 Te encontrar quando abro os olhos, quando tua voz rouca me desperta, me perder em você feito criança descendo ladeira.
 Ouvir teus sons, teus risos. Teus passos incertos...Me encantam as tuas maneiras, teu ar de quem conhece tudo, de quem ama o mundo e admra todos esses jeitos de sorrir .

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Quando ela ligar

  Acordo, espreguiço-me livremente na cama, sem os limites impostos pelo seu sono leve, e sem me preocupar com o pecado do hálito matinal impuro .
Ando descalço pela casa, respirando o silêncio, dando bom-dia aos livros, acenando calorosamente para os CDs. Vou até o banheiro e deixo a porta aberta, sem a obrigação de vigiar a tampa do vaso . Aperto a pasta-de-dentes pela cintura, jogo as roupas todas pelo chão, tomo banho fazendo festinha, cantando alto. Me enxugo e vou até o quarto, arremesso a toalha em cima da cama ( ainda desarrumada ), pego a camisa listrada mais amarrotada que vier e tenho o cuidado de combiná-la com a, velha e boa, bermuda xadrez desbotada .
  Ligo o rádio na estação de MPB, no volume que mais me agradar, já que não vou mais ouvir que isso é música para caretas .
  Vou até a cozinha, sem precisar dar de cara com o cheiro do seu café forte. Como sem pressa, sujo a toalha de mesa toda com migalhas, moldo bolinhas perfeitas com o miolo do pão .
  Quase me esqueço do perfume, que agora uso até que me exploda a cabeça, sem ter que prestar atenção em suas alergias. Estou deixando a minha barba crescer, porque sua pele não corre mais o risco de ser arranhada por ela .
  Voltei com o futebol, fiz amizade com a vizinha do 304, troquei as cordas do violão e ganhei um aumento .
No mais, está tudo na mesma . Obrigado por se preocupar .
[ Ele decide que este é o discurso ideal para quando ela ligar. Ele põe a foto dela de volta na gaveta, com o rosto virado para baixo. Sente-se mal e percebe que não tem a quem pedir um copo de água. Definitivamente, aquelas garrafas de vinho não eram boa ideia...Se dá conta que bebeu todas elas, sozinho. Se esqueceu de trancar a porta e agora não vai mais levantar. Puxa os lençóis e vira para a janela, com as cortinas abertas. Antes de pensar como será desagradável acordar amanhã com a visita indesejada do Sol, ele adormece .
Talvez nem consiga sonhar .]

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

9 de Fevereiro

           Carta a um aquariano de 9 de fevereiro :

       
 " Você me diz que odeia escrever sobre o coração, e eu concordo contigo. Mas hoje, confesso que lembrei de você e pequei...escrevi sobre esse que não é usado por nós dois .
Sim, porque como insistem em nos lembrar, somos sujos e amamos com a mente, sofremos de um mal que poucos enxergam e que não fazem por onde compreender .
Hoje pequei...escrevi sobre o meu coração, aquele que opta por emudecer, que vive submisso às minhas escolhas, que não conhece o exterior, que nunca se doou .
Hoje, insisto em cometer o que parece ser o maior dos meus pecados : não mentir . Não coloquei minhas dores na boca de personagens ! Não falei de experiências alheias que observei, não me coloquei como o ser inatingível que desvenda o papel.
Hoje, lembrei de você e pequei, sendo eu mesma o ser deflorado que se vê incrustado em letras . Hoje, pequei ao me dar conta que sei onde está o meu coração que sei como ele vive e onde ele quer estar . Mas, acima de tudo, pequei porque me lembrei de você . Você que parece saber ' de tudo da ferida viva...'
Sabe, eu queria te perguntar, deixar de ousar o pós-amor é perder a poesia ? Mas eu mesma penso que sei a minha resposta, uma vez que eu deixando de ousar o pós amor, enganando a vida, seduzindo a fórmula do universo, achei meu coração .
Será que achando o meu coração, não minto mais e perco o pecado que é ser poeta ?
Não sei não, só sei que preciso conversar logo com você !
Obrigada por ser o espelho do meu coração .
Alô, Abigail ! "
     Feliz Aniversário, Adriano Sant'anna, ' Dri' .

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Feche as janelas

Adoro olhar o teu amor dormir...adoro olhar teu olhar descansando, teu sono calado, e a saudade que sinto já...
Mais que um beijo de boa noite, se você quiser, eu aquecerei teu sono e te mostrarei mil maneiras de voar . Mais que um beijo de boa noite, eu serei tua noite, eu serei teu lençol. Te dou meus sonhos para usá-los como travesseiro, porque te dar meu corpo todo é pouco...
Posso ser a luz que te acorda, já sou voz que te adormece...
Quero impedir que o frio roube o meu direito de tocar tua pele, trazer à tona teu sorriso quando você menos esperar, afastar tuas tempestades, desfazer cada tristeza, te proteger por puro amor .
Vou te contar as histórias que os poetas não escreveram, incorporar o teu riso ao meu, tirar teus sonhos da deriva .
Mas se você quiser, eu te trarei para a minha certeza, para compararmos as verdades e seguirmos o que nos faz crescer .
Porque adoro olhar teu amor dormir...

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Aos amantes de ventanias

Parei para observar uma criança que experimentava várias sensações guiando uma pipa. Tudo nela era intenso e surpreendente, tudo nela se confundia, se multiplicava .
Ela ria e parecia estar surpresa consigo mesma quando seu toque rendia movimentos inimagináveis em seu brinquedo perdido no ar . Brinquedo esse que era alvo de todo o seu olhar, de toda a sua inspiração e paz .
Eu a olhava correr, gritar e insistir na brincadeira, e sem querer, comecei a comparar o que via com o que sentia. Pensando dessa forma, cheguei a conclusão que a metáfora certa seria : a criança sou eu, e a pipa que vagueia...se parece muito com meu coração .
O meu coração-pipa...leve, colorido, livre, flutuando pelos meus olhos. O meu coração é assim, se a brisa que há for leve demais...ele entristece por não se perder. Por mais que seja eu quem o guia, um toque de vento forte o torna imprevisível, uma vez que o ponho no ar, em meio a dezenas de outras pipas...um verdadeiro festival de corações vagabundos que interpelam esse tal direito de amar .
O meu coração é pipa, que é livre, mas se perde se não estiver ligado a uma mão que o detenha .
E eu...eu sou só uma criança que pensa que guia a pipa, quando na verdade, é guiada por ela. Deixa que ela seja o centro da sua vontade, que sofre, que ri e corre por ela .
Eu sou a criança que se diverte e se machuca, mesmo sabendo que terá que ter forças para segurá-la consigo...porque tem consciência de que é preciso ter coragem para ' soltar pipa' .
Saindo dos meus pensamentos, enxerguei novamente a criança embaixo da minha janela, que agora chorava por ter perdido a pipa . Me dei conta que eu nada tinha de parecido com aquela criança, já que eu não vou chorar quando perder a minha, quero mesmo que o meu coração-pipa aprenda a voar sozinho e encontrar o seu caminho de vento incessante e que seja encontrado por outra criança, já que, 'pipa solta' é de quem pegar .

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Dia de Brinquedo

Vejo estas crianças correndo na casa onde cresci. Vejo pela janela branca da sala, a árvore que retorcida que se enfeita de flores vermelhas no verão. Vejo o sol do meio-dia fazendo brilhar as frestas do, sempre verde, portão .
Sinto as folhas amareladas da romã roçando meus pés enquanto abro o portão lateral, que esconde tomates e abóboras, se enroscando pelos matos, assim como nos contos da Gata Borralheira .
Subo as escadas de pedra e encontro a visão do que era o Grande Mundo para mim : a paisagem de morros verdes penteando as nuvens e refugiando o sol, o mato alto com um intraduzível cheiro fresco, a estrada de terra que me parecia infinita .
Entro em casa e sinto o chão gelado da cozinha, onde sempre há cheiro de café . Ouço as histórias dos crimes que passam na televisão, mas que chegavam lúdicas aos meus ouvidos pela forma como saíam da boca da minha avó . Histórias estas que sempre tinham ao fundo, o som de uma máquina de costura que paria os meus vestidos e os das bonecas também .
Sento na varanda como sempre fiz, quando ficava esperando para ouvir o som das botas caramelo da minha mãe, o cadeado sendo aberto sempre com pressa pela minha irmã, as músicas da minha madrinha, a forma certa e ritimada do meu tio de limpar os pés, a voz rouca da tia Alice, a forma boba e tímida do primo de brincar com o cachorro e a risada estonteando do padrinho, que insisto em esperar, mesmo sabendo que nunca mais vou ouvi-la .
Os meus sons, os meus cheiros, os meus sabores, as minhas lembranças...que construirão sonhos de outras crianças .

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Os Escafandristas

                                                       Para : Paulo Rob
Eu olhei no espelho e vi a imagem toda borrada de uma mocinha esfregando os olhos .
Pensei ter ouvido seu bocejo exagerado, mas a casa que foi nossa está silenciosa pela primeira vez. Eu acordei sozinha, sem sua risada bagunçando meus deveres...Como vai ser daqui pra frente, se eu tiver que aceitar a sua ausência ? É insuperável...Eu estou distante de ilusões, vou tentar não chorar mais e nem pensar em te tocar por um instante, sei que de nada adiantaria, mas não posso agir como se você não houvesse estado aqui por tanto tempo. Toda canção que fala de amigo ou amor me lembra você, me faz querer te convencer. Fico lembrando os nossos diálogos e tudo o que você me ensinava.
Aí sinto com exatidão a dimensão dos seus braços frios me entrelaçando as costas, me pegando no colo, me jogando no ar. As suas roupas não estão mais aqui e nem voltarão a estar...Aquela sua camisa verde que eu adorava, seus óculos sempre nos lugares errados, suas músicas fora de hora...Tudo isso que, indo embora, esvazia a casa e a mim .
Que saudades do cheiro do seu cabelo...Sem você, não haverá mais dança nesta casa .
São insuportáveis as lembranças de você chorando e tirando suas coisas daqui, dizendo que o o amor já não cabia mais em nós e que estávamos nos tornando um, que eu era o melhor de você, que você era o melhor de mim e isso estava nos anulando. Que não deviamos ter deixado chegar neste ponto, que tínhamos construido um escafandro e estávamos tentando, a qualquer custo, nos prender dentro dele...mas, num escafandro só há lugar para um, e você resolveu ocupá-lo, não é, meu bem ?
Olho os nossos sorrisos empoeirarem nas fotos. Você foi embora ontem à noite e tudo ainda tem o seu cheiro, meu mais raro amigo, meu amor...
Como eu vou viver sem teu ritmo ? Eu quero resistir, eu quero sim . Mas, mesmo que passem os meses sem que eu perceba, a cama ao lado da minha permenecerá vazia, e a sua falta continuará a cerca de mim .
Vou voltar pra cama, hoje eu permito que a vida não espere por mim .

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Posso te fazer uma pergunta ?

                                                                                          Para : Buu .
Hoje pensei em te ligar, ...mas acabei esquecendo, assim como em todos os dias, certifico-me de que vou esquecer de tê-la . Sua voz ao telefone só me faria desobedecer minha imposição, ela já é o bastante para me sequestrar para momentos a sós, nos quais somente as suas lembranças são capazes de me alcançar .
Fico pensando como seria tudo agora, se não tivéssemos pensado tanto no futuro...se eu tivesse tentando enxergar o que realmente tínhamos...e não consigo chegar a uma certeza, quando quase consigo ouvir minha boca te dizendo o que não fazer e sentindo a sua fazer exatamente o contrário . As suas risadas me coloriam, sua pele me encantava tanto que eu queria cantá-la a todos que pudessem acreditar no calor que tinha .
Eu achava certo me dedicar a não pensar em você, a apenas querer te tocar todos os dias, não sabia que estava apenas sentindo sem pensar .
Ainda sinto o cheiro do seu cabelo me embaçando as decisões, seus olhos indecifráveis me dizendo tanto...eu me permitia sem saber .
Mas, os dias continuam passando sem poupar os seus vestígios em mim, e quase tudo vai ficando para trás...a leveza, a felicidade, o riso... é tarde para me convencer que te amo .

domingo, 16 de janeiro de 2011

Quem tem medo de chuva ?


Quem tem medo de chuva ?
Ela se perguntava, debruçada na janela...Não conseguia entender o motivo o medo, não entendia quem tinha medo dela . Mas, se ela não entendia..por que o tinha ?
Ela também não entendia.. ela não entendia muitas coisas, principalmente tratando-se dela mesma !
Tão bela, tão limpa, tão cheia de adjetivos... Falo da chuva ou da moça ? Mas também não seria uma moça a chuva ?
A moça olhava, debruçada na janela, como incrivelmente as cores se transformavam ao serem tocadas pelas gotas . Os tons de vermelho desmanchavam em rosas pálidas, os azuis fluiam numa dança inigualável, os verdes pareciam mistérios...Mais parecia uma bonita pintura, visto dos olhos da moça, a paisagem se desmanchando em água .
A bela moça admirava a metamorfose de cores, enquanto de seus olhos brotava uma chuva cálida .
Do lado de fora, a chuva forte e calma limpava, e devia pensar que mais parecia um triste quadro, a bela moça debruçada na janela, vestida de vermelho, tão gasto que mais parecia uma rosa pálida; flores azuis em suas mãos, verdes olhos compostos de mistério e lágrimas .
Parada, a moça pensa que ela mesma poderia ser a rosa pálida que brota dos vermelhos. Mas, para que tanto medo de chuva ? Será que tem tambem tanto medo da vida ? Pra que tanta lágrima ?

Ela queria tanto ser como a chuva, que corre sem barreiras, que transforma, que nunca é a mesma...E então, por que não ser ? Ela desperta e corre para a vida ! Tão livre, tão bela, forte e tão certa !
É engraçado, como agora a água transformava seu vestido gasto em lindo manto vermelho-vivo; as flores azuis em suas mãos agora enfeitavam as macias cascatas castanhas que jorravam pelas suas costas; a grande chuva lavou a calidez dos olhos verdes da bela, que agora brilhavam vivos na razão que há na loucura....
Tão bela, tão forte, tão viva.. falo da moça ou da chuva ?
Quem tem medo de chuva ?

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Bodas de Prata

 Vinte e quatro anos, alguns vários miligramas de tarja preta, analgésicos, dietas infernais, viagens e vinte e quatro anos...
  Vinte e quatro anos...Se eu soubesse que o idealismo vermelho dele não resistiria nem três anos, talvez eu tivesse ido em frente no meu projeto de aprender a beber e trocar de curso na universidade. Se eu soubesse que nossa utopia conjunta de amor se resumiria às frias jóias que ele me dava, talvez eu tivesse exercido o direito de ser jovem...mas não .
Eu tinha vinte e quatro anos, uma família socialite para agradar, um noivo cabeludo (que andava com a mesma camisa com estampa de estrela no peito por três dias seguidos), uma faculdade de psicologia numa universidade conceituada para concluir e poucos sonhos. Eu apenas queria um marido no qual eu pudesse dar o nó na gravata, criar crianças e dizer, todos os dias, aos meus pacientes no consultório : -" Como se sente sobre isso ?"
 Eu nunca dei ouvidos aos meus instintos de jovem dos 'anos 80', fui taxada de ' careta ' por todos, mas eu estive muito ocupada com as  provas de vestido, lista de convidados, decoração da igreja e à esperança lúdica de um dia dar uma festa de Bodas de Prata...vinte e cinco anos completos de um casamento seria a glória . Enfim, estive ocupada com todos os preparativos e desejos para o  que seria a grande loucura da minha vida : casar com um garoto menos rico que eu, que usava barba e era rotulado como a ovelha negra, ou melhor, a ovelha vermelha de sua família .
  A grande verdade é que a ovelha negra tornou-se um requisitadíssimo publicitário. Logo, as flores, os beijos e os versos tornaram-se casa de campo, casa de praia, jóias e finais-de-semana vazios em Seviilha.
  Todos diziam : Stella ? É uma mulher realizada com um marido que lhe enche de mimos. Realmente, pode até ser que eu seja...mas, vivo à base de calmantes para aturar os amigos chatos do meu marido, todos eles sempre cheirando a whisk, para estar sempre impecável nos coquetéis, para responder com inteligência e bom-humor milhares de perguntas inoportunas e ter a calma de ouvir meus pacientes e depois sempre dar-lhes ao mesmo diagnóstico :  " A culpa é de sua mãe . "
  Eu gostaria de dizer àquelas mães que, quanto aos filhos, é melhor ter jóias...a desculpa que dou a mim mesma por não poder tê-los .
  Enfim, vinte e quatro anos de um casamento, vinte e quatro anos em vão ! 
  É isso, eu sou Stella Madeira, não mais a Senhora Castro. Psicóloga, sem filhos, recém-saída de um casamento que durou vinte e quatro anos inférteis. Tanta maquiagem, perfume, literatura alemã...tudo em vão . Não terei crianças para educar e nem ao menos amigos de marido para impressionar .
  Sou uma mulher que não foi mulher, que não teve filhos, que viu o amor acabar sem ao menos dar uma festa de Bodas de Prata. Stella Madeira não fez Bodas de Prata.
  Infeliz Stella .